14 de jun. de 2007

TRANSCRIÇÃO DO DISCURSO DO DR. NECHAR



CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Sessão: 019.1.53.O Hora: 15:06 Fase: GE Orador: DR. NECHAR Data: 28/02/2007


O SR. PRESIDENTE (Manato) Com a palavra o Dr. Nechar, por até 25 minutos.

O SR. DR. NECHAR (PV-SP. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Deputado Manato, caros Deputados, primeiro, quero agradecer a Deus pela oportunidade de ocupar pela primeira vez nesta tribuna e dizer ao meu pai e à minha família que lhes agradeço o apoio que me deram nessa empreitada.

Entretanto, venho a esta tribuna não para somente criticar, mas para demonstrar, médico que sou, profissão que exerço há 30 anos, enorme preocupação com a saúde pública do nosso Brasil.

Srs. Deputados, a saúde brasileira está na UTI. Temos uma árdua tarefa pela frente — nós, representantes do povo, muitos aqui médicos como eu, eleitos para defendermos os cidadãos de bem, que pagam seus impostos e ajudam este País a crescer — , fazer com que o Sistema Único de Saúde — SUS garanta saúde de qualidade para todos os cidadãos brasileiros, indistintamente, cumprindo o que determina nossa Constituição.

Nobres Deputados, para tentar explicar o que estou dizendo, vou sair da situação macro e falar sobre a minha região, Marília, no interior do Estado de São Paulo.

A verba que o SUS repassa é insuficiente, não atende às necessidades da nossa população, o que provoca filas gigantescas àespera de cirurgias ou atendimentos eletivos, a exemplo de uma simples postectomia, vulgarmente chamada de cirurgia de fimose.

Na teoria, meus amigos, meus Colegas Deputados, o SUS é um modelo de sistema de gestão de saúde pública que pode até ser exportado, com programas altamente eficazes, vide, a exemplo, o combate e o tratamento da AIDS, reconhecido mundialmente, estabelecida pelo Ministro Alceni Guerra, hoje nosso Colega Deputado.

Não poderia deixar de dizer que o SUS tem um sistema de controle social dos gastos, através dos fundos e principalmente dos conselhos municipais, que, evidentemente, envolvem a população, que precisa ter mais seriedade e mais atenção na escolha daqueles que fazem parte dos mesmos.

Os conselhos municipais, portanto, deveriam ser muito mais eficazes na ação que exercem.Tentarei explicar alguns exemplos.

Primeiro, o SUS tem tabela de procedimentos de aproximadamente 2 mil itens, totalmente desatualizada, com valores irrisórios, para não falarmos ridículos. A última atualização dessa tabela foi em 2001.

Depois houve o congelamento do teto que é oferecido aos hospitais das cidades, ou aos prestadores de serviços, ou aos credenciados. Desde julho de 1998 esses hospitais têm o mesmo teto.

Cito aqui alguns exemplos de hospitais, tais como a Santa Casa de Marília, da minha cidade, que é referência em atendimento de alta complexidade, atende a cerca de meio milhão de habitantes e tem atualmente teto definido de 880 mil reais. Mas mensalmente esse hospital — no qual atendo e opero — excede esse valor em aproximadamente 300 mil reais. Geralmente isso ocorre porque quando o paciente chega à urgência ou à emergência, seja com apendicite aguda, seja com infarto do miocárdio, logicamente o hospital terá de interná-lo.

Porém, na hora da cobrança, caso já tenha sido ultrapassado o teto máximo, só será pago ao hospital o teto.

Além da tabela do teto dos hospitais, ressalto ainda a baixa contribuição per capita enviada anualmente pelo Governo, que gira em torno de 230 reais na minha região. Pasmem, Sras. e Srs.

Deputados, segundo dados da Organização Mundial de Saúde, os Estados Unidos investem cerca de 15,2% do seu PIB; o Japão, 7,9%; a Itália, 8,4%; e o Brasil, 7,6%. Ou seja, o financiamento da saúde no Brasil representa, portanto, menos de 1 real por dia/ habitante.

Outro ponto a ser notado é a participação das três esferas de Governo no gasto público com a saúde que, entre os anos de 1995 e 2004, na esfera federal, caiu de 60,7% para 49,6%; enquanto que o das fontes estaduais e municipais cresceu de 39,3% para 50,5%.

O Orçamento da União é de aproximadamente 1,5 trilhão de reais em 2007, sendo que para a saúde a contribuição inicial foi de aproximadamente 49 milhões de reais, dos quais 5 milhões de reais jáforam contingenciados pelo Governo Federal.

A arrecadação de CPMF, que contribuiria para a área da saúde, ao longo do tempo, teve a seguinte evolução: 6,4 bilhões de reais, em 1997; 20 bilhões de reais, em 2005; e 32 bilhões de reais, em 2006.

Também aproveito para mostrar aos senhores e a toda a população que nos acompanha outros dados que consegui junto às Secretarias Municipais de Saúde.

Atualmente, na tabela do SUS há cerca de 2.000 procedimentos cadastrados e, desde o ano de 2001, não é reajustada.

Hoje, o SUS paga por uma consulta médica cerca de 7 reais 55 centavos, sendo que 2 dois reais e 55 centavos ficam para o hospital e somente 5 reais é o que o médico recebe.

Por um ultra-som de mama, por exemplo, paga-se 13,34 reais; por uma endoscopia, 28 reais.

Isso faz com que os prestadores de serviços deixem de realizar determinados procedimentos por não valer a pena, jáque o dinheiro fica praticamente retido nos hospitais.

A defasagem da tabela, somada à falta de recursos e investimentos, provoca filas, com milhares de pacientes à espera de simples exame como o ultra-som, o que é inaceitável.

As filas se estendem em diversas áreas porque, além do teto dos hospitais congelado, da falta de recursos, do per capita irrisório, de desatualizada tabela de procedimentos, atualmente, quase 85% dos repasses do SUS acabam sendo utilizados em atendimentos de urgência e emergência, deixando os procedimentos eletivos para segundo plano, o que gera as enormes filas.

Um paciente que está na fila para cirurgia eletiva, por exemplo, de hérnia inguinal, só será operado quando a patologia complicar, ou seja, quando a hérnia encarcerar e o procedimento cirúrgico for totalmente superior ao que deveria ser feito. Caso contrário, ficará na fila de espera.

O Sr. Dr. Ribamar Alves - V.Exa. me concede um aparte?

O SR. DR. NECHAR - Com prazer, Deputado.

O Sr. Dr. Ribamar Alves - Deputado Dr. Nechar, parabenizo V.Exa. pelo importante pronunciamento que faz nesta tarde. Desde que entrei nesta Casa, em 2003, a Frente Parlamentar da Saúde, sob a Presidência do Deputado Rafael Guerra, tem empreendidos esforços para a melhoria da qualidade dos procedimentos e também dos recursos repassados para os pagamentos do sistema SUS. E tramita na Casa a Emenda Constitucional nº 27, que está em fase final de regulamentação.

O SR. DR. NECHAR - Irei me referir a ela em seguida, Sr. Deputado.

O Sr. Dr. Ribamar Alves - Pois bem, temos a responsabilidade de buscar a aprovação final dessa proposta para que seja imediatamente posta em prática, sob pena de que esses problemas da saúde, que hoje são pontuais, se transformem ainda mais universais e piorem a cada dia.

Os Governos Estadual e Municipal não aplicam os percentuais constitucionais na saúde como deveriam e ficam apenas como fonte única de financiamento, sobrando para o Ministério da
Saúde cuidar de toda a saúde do País. A municipalização da saúde, a que sempre fui favorável, infelizmente, na prática, passou a ser uma prefeiturização, em que Prefeitos usam e abusam da prerrogativa de determinarem para onde vão os recursos, além de manipularem os Conselhos Municipais de Saúde, os quais, na maioria das vezes, estão instalados nos seus escritórios, nas suas casas, nas suas cozinhas, esquecendo que a saúde é um direito de todos. Parabéns a V.Exa.
Esperamos que esta Casa aprove a PEC nº 27, para vermos regulamentada a saúde do País.

O SR. DR. NECHAR - Ouço, com prazer, o aparte do Deputado Mauro Benevides.

O Sr. Mauro Benevides - Deputado Dr. Nechar, na Legislatura passada, houve mobilização nesta Casa, em que todos trajávamos a indumentária própria de quem entra para um ato cirúrgico, na tentativa de mobilizar a opinião pública para garantir os recursos que V.Exa. agora postula com muito conhecimento de causa para a saúde. Portanto, os aplausos a V.Exa. e nossa solidariedade nessa luta indormida.

O SR. DR. NECHAR - Agradeço aos nobres Deputados Dr. Ribamar Alves e Mauro Benevides os apartes.

Continuando, o hospital recebe, pela realização de uma cirurgia de hérnia, 38 reais; o anestesista, 15 reais; o auxiliar, 15 reais; e o cirurgião, 20 reais. Agora, pasmem, senhores: o que podemos gastar em exames laboratoriais com esse paciente são 27 centavos — é isso mesmo que vocês ouviram, 27 centavos. Se um urologista, por exemplo, realizasse 20 cirurgias de postectomia, ou cirurgia de fimose, por mês, ele receberia, ao final do mês, 400 reais, sem deduzir os impostos. Numa cirurgia de vesícula, o hospital recebe 317 reais; o anestesista, 61 reais; o auxiliar, 61 reais; e o médico-cirurgião, 82 reais.

Podemos ver e sentir o caos que vivemos na saúde pública. O problema é que isso não acontece apenas na minha região, mas em todo o País, como os nobres Deputados puderam perceber, tanto assim que apoiaram o nosso discurso. A falta de investimentos sufoca os hospitais de todo o Brasil, que, por sua vez, acabam fechando suas portas.

Levantamento recentemente realizado mostrou que no ano passado, em 2006, foi fechado um hospital por semana no Brasil. Que fazer? Eu não vim aqui para fazer críticas ao Governo Lula, não vim fazer críticas destrutivas. Vim tentar propor soluções para a saúde do Brasil.Por isso, Sr. Presidente, nobres Deputados, venho a esta tribuna para pedir a sensibilidade de todos nós e, principalmente, do Poder Executivo, para melhorar essa situação.

Cito algumas medidas que considero de extrema importância para que essa situação seja controlada, Deputado Paulo Maluf: a primeira, fazer um novo, confiável e sério censo, para determinar os valores a serem repassados. A segunda, aumentar o valor per capita repassado. A terceira, atualizar a tabela de procedimentos. Feito isso, automaticamente, o teto repassado aos hospitais será corrigido.

A CPMF seria de extrema importância para a saúde do povo brasileiro se o Governo Federal destinasse corretamente os recursos arrecadados. Essa Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira — hoje permanente — , nunca esteve voltada para a Saúde. O ex-Ministro Adib Jatene deve estar muito triste com isso.

A CPMF, Deputado Paulo Maluf, não foi criada para pagar juros ou dívidas. Ela precisa ter seu destino previsto em lei. Cumpre lembrar que, se apenas 50% da arrecadação da CPMF fossem destinados à Saúde, os problemas desse setor estariam resolvidos.

No tocante a essa questão, quero pedir especial empenho de todos os Deputados para aprovação do requerimento do nobre Deputado Vital do Rego Filho (PMDB/PB), apresentado no último dia 22 de fevereiro, que, nos termos do art.114, inciso XIV, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, pede a inclusão, na Ordem do Dia, do Projeto de Lei Complementar nº 01/2003, de autoria do Deputado Roberto Gouveia, que regulamenta o § 3º do art. 198 da Constituição Federal.

Esse artigo trata da aplicação de recursos para financiamento das ações e dos serviços de saúde — renderia, aproximadamente, 10 bilhões de reais a mais, por ano, à saúde. Além disso, dispõe acerca do rateio dos recursos entre União, Estados e municípios, bem como do processo de fiscalização e das normas de cálculos a serem aplicados pela União. Sem isso, a Emenda Constitucional nº 29, de 2000, que deve trazer inúmeros benefícios para o setor de saúde pública, não atingirá o seu objetivo total.

O Sr. Paulo Maluf - Concede-me V.Exa. um aparte?

O SR. DR. NECHAR - Com prazer, Excelência.

O Sr. Paulo Maluf - Dr. Nechar, eminente Deputado e médico, quero congratular-me com V.Exa. pelo seu altíssimo espírito público, pelos serviços médicos do mais alto interesse social prestados em Marília e região, pela presença de sua família, sempre com muito espírito público, na política de São Paulo, por intermédio de seu tio, Dr. Pedro Nechar, que foi Prefeito de Catanduva, e pela coragem que V.Exa. demonstra em enfrentar esse problema da CPMF. Quando era Ministro da Fazenda, o eminente Prof. Adib Jatene foi, pessoalmente, de gabinete em gabinete, defender a aprovação dessa matéria, perante os Deputados Federais, porque a verba se destinaria à Saúde. O que aconteceu? Ele e todo este Congresso foram ludibriados, enganados, tapeados. Arrecadou-se a CPMF, mas o dinheiro não foi para a Saúde. O Ministro Adib Jatene teve a hombridade de pedir demissão do cargo — ele não tinha apego ao cargo, mas à obra que estava fazendo. De maneira que estamos plenamente de acordo com o apelo de V.Exa. Ou a CPMF vai verdadeiramente para a Saúde — para isso foi criada — , ou não vamos resolver o problema da saúde pública no Brasil. Meus cumprimentos a V.Exa.

O SR. DR. NECHAR - Muito obrigado, Deputado Paulo Maluf.

Ouço, com prazer, o nobre Deputado Roberto Britto.

O Sr. Roberto Britto - Nobre Deputado, congratulo-me com V.Exa. pelo oportuno pronunciamento e aproveito a ocasião para corroborá-lo dizendo que, realmente, há fechamento em massa de clínicas por falta de condições de funcionamento. No meu município, no Estado da Bahia, muitas clínicas têm sido fechadas, em decorrência da baixa remuneração que recebem, causando grande desemprego entre os auxiliares de enfermagem, enfermeiros, enfim, entre paramédicos. Sugiro ao eminente colega que faça cópias do seu discurso e repasse aos Deputados da área de saúde. Parabéns pelo pronunciamento.

O SR. DR. NECHAR - Ouço, com prazer, o nobre Deputado Geraldo Pudim.

O Sr. Geraldo Pudim - Deputado Dr. Nechar, parabenizo V.Exa. pelo brilhante discurso, que demonstra seu conhecimento acerca das questões relacionadas à saúde em nosso País. Para colaborar com V.Exa., trago dados importantes. V.Exa. disse que, no ano passado, arrecadou-se 32 bilhões de reais com a CPMF. Desse montante, 6,4 bilhões de reais são desvinculados, podendo ser aplicados em qualquer área, inclusive no superávit primário.

Dos 25,6 bilhões de reais restantes, 13,5 bilhões de reais são efetivamente aplicados na Saúde: 6,7 bilhões vão para o INSS e 5,4 bilhões destinam-se ao Fundo de Combate à Pobreza. Como sabe V.Exa., é necessário repassar esses recursos para as áreas onde acontecem as ações de base na área de saúde, ou seja, Estados e municípios. Também deve haver uma melhor repartição desses recursos e uma redefinição da aplicação da CPMF. Muito obrigado.

O SR. DR. NECHAR - Isto é verdade.

Ouço, com muito prazer, o nobre Deputado Talmir.

O Sr. Dr. Talmir - Nobre Deputado Dr. Nechar, parabéns pelo seu discurso. V.Exa. enfatizou que a saúde está na UTI. Enquanto ouvimos seu maravilhoso discurso, pessoas estão morrendo nas filas de muitos hospitais. Precisamos acordar. Continue prestando esse serviço relevante à comunidade. Parabéns.

O SR. DR. NECHAR - Sr. Presidente, nobres Sras. e Srs. Deputados, feitas essas considerações, agradeço, de público, ao Ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, a presteza com que nos recebeu em seu gabinete — dois dias depois de tomarmos posse na Câmara dos Deputados. Na reunião, que contou com a presença do ilustre Coordenador-Geral de Manutenção e Restauração Rodoviária do DNIT, Sr. Alex Peres Mendes Ferreira, S.Exa. confirmou o início das obras de recuperação e conservação do trecho paulista da BR-153, rodovia federal que corta a região de Marília a Ourinhos e de Marília a Promissão, passando pela cidade de Lins. Essa era uma antiga reivindicação dos motoristas, de empresários e da classe produtiva da região, que usam a rodovia como forma de escoar a produção regional e para trafegar com suas famílias.

Ouço, com prazer, o Deputado Lelo Coimbra.

O Sr. Lelo Coimbra - Deputado Dr. Nechar, na condição de médico sanitarista e cooperado da UNIMED Espírito Santo, hoje fui ao evento da Frente Parlamentar do Cooperativismo. As palavras de V.Exa. trazem profunda preocupação ao movimento sanitarista brasileiro. Com relação à CPMF, V.Exa. tem razão: o Dr. Adib Jatene deve estar morrendo de arrependimento por ser autor de um grande produto que não teve o destino desejado, a saúde. Temos de lutar bravamente para que a PEC nº 29 seja apreciada e aprovada, a fim de que sejam corrigidos esses valores per capita dos procedimentos pagos aos hospitais e, mais grave ainda, às instituições filantrópicas que prestam serviço de saúde.
Não falo aqui das 'pilantrópicas'. Falo daquelas que têm sociedade organizada que, em razão do baixo custeio mensal feito pelo SUS, acabaram optando por manter a estrutura de pessoal em detrimento de impostos e hoje acumulam uma dívida importante, fazendo com que suas capacidades de gestão sejam diminuídas. Portanto, parabéns a V.Exa. pela manifestação e considere-me um aliado na luta em benefício do povo brasileiro e do setor saúde.

O SR. DR. NECHAR Obrigado.

Durante o discurso do Sr. Dr. Nechar, assumem sucessivamente a presidência, os Srs. Inocêncio Oliveira, 2º Vice Presidente, e Vanessa Grazziotin e Pedro Fernandes, nos termos do § 2ºdo artigo 18 do Regimento Interno.


FONTE: Site da Câmara dos Deputados

ÁUDIO DO DISCURSO: PLAYER NO FINAL DA PÁGINA.

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